ESPERANÇA
Ignez Sparapanni
No açude de hipocrisias
Quero receber a mensagem
De esperança das montanhas;
Admirar a pureza das nuvens;
Perceber a ingenuidade do Caboclo
Ser surda ao vento furioso
Causador do murmúrio das águas;
Ignorar os acordes
De uma brisa compassada...
Para então partilhar
Da alegria dos pássaros
PORTO DAS ILUSÕES
Ignez
Sparapanni
Ontem a menina
aportou
Para
olhar fim de tarde velejante
Despejar
seu jeito depois
Jazer junto ao lajeado cais.
(igualzinho
a um poema)
E por um
momento
A menina
desconfiou
Que a
vida desmanchava-se ali.
Logo
depois
Já em
face a face da noite
A menina
descobriu seu coração em atalhos
Porque os
sonhos primeiros tinham partido
Lépidos
Numa
estranha sombra de mar
Todinha
estampada de estrelas,
Lua,
brancas areias, azaleias
(igualzinho
a um poema)
Em
seguida
A menina
ensaiou um gesto qualquer de tristeza
Ensaiou;
mas saiu apenas
Um gesto
qualquer de alegria
Simples
sorriso de outono
Bem mais
tarde
A manhã
veio naufragar brejeira nos olhos da menina
Naquelas
poucas águas paradas
De tanta
partida e fantasia
CANÇÃO DA
ESPERA
Ignez
Sparapanni
Sendo a
sombra, apalpo o medo
Que sobre
mim se resvala.
Para
cantar ainda é cedo,
Mas minha
voz não se cala
Há noite
Espessa lá fora
Nenhum
galo ainda canta
Mas
brilha em meu peito a aurora
Nasce o
sol em minha garganta
SER
Ignez
Sparapanni
Queria
apenas um momento de imperfeição
Para que
cada palavra se tornasse uma nota musical,
Cada
sentimento uma cor inimaginável,
E cada
pensamento a perfeição marginal entre o coração
E o que
não pode ser.
OS DIAS
SE VÃO...
Ignez
Sparapanni
Os dias
se vão ou NÃO
Perdem-se
no tempo como balões no infinito.
Tudo
acontece. Próximos ou distantes
Os seres
vivem e eu nada sei sobre eles
Em mim ha
vagas ideias apenas imagens irreais,
Recursos
naturais, incertos e humanos
Os dias
se vão, os meus os seus, os nossos... quem sabe...
Talvez se
aprendermos a soltar balões,
Quem
sabe... Os nossos... quem sabe...
RASGANDO
O AZUL
Ignez
Sparapanni
Seu rosto
carente dança nos meus olhos perdidos!
No
bailado das ninfas há a doce incógnita de uma tarde molhada.
Paira no
ar o veneno do sulfato
Das rosas
esmagadas na calçada, suspiros!
No seu
olhar arde uma prece inflamada
No meu,
em ritmo alucinante,
Dança uma
deusa ferida
Desenha
caricias no seu corpo adormecido de gemidos!
Faz-lhe
voar como pássaro
Ganhar o
universo temido
Num olhar
toma-lhe os lábios
E alcança
o eterno
Assim,
livremente, ensina-o e aprende a amar
E,
deposita em suas mãos
O brilho
de uma estrela cadente, risos!
Estamos
livremente perdidos no azul infinito do céu!
NAVEGAR...
PRECISEI...
Ignez
Sparapanni
Começou a
chover. Dia ainda.
De
repente o despedaçado coração
Sentiu
vontade larga de navegar
Navegar
Na
enxurrada lenta que
Calava a
voz da rua.
Navegar
bonito
No raso
dos olhos mais cinzentos
De uma
cidade sem poente.
Vai daí,
O coração
se arranjou todinho
Dentro de
um pequeno barco de papel
E lá se
foi...
Enquanto
isso,
O magro
corpo se molhado
Malemá
conseguia se despejar inteiro
No leito
das velhas esperanças.
(E, muito
menos, na inutilidade do tempo)
BOBA-DA-CORTE
Ignez
Sparapanni
Ah, se eu
pudesse despedaçar as algemas
E
cuspi-las fora de Minha Alma,
Pisar
vossas vestes e roçar-vos no rosto
O amargor
destes anos cansados de tanto repudio,
Tanger
meus dentes em ouvidos serenos
E
abrandar vossos risos,
Abafando
os soluços
Nas
minhas ásperas mãos.
Ah, se eu
pudesse burlar-me de vós,
Ostentar
a bandeja onde pousa serena e soberbamente
A cabeça
de Rei, minha Senhora
PENITÊNCIA
Ignez
Sparapanni
O garfo
passeia no ar
Mas a
visão esta distante
E corre
nos campos da infância,
Para onde
não há retorno.
Por
dentro dos campos fechados
Corações
prisioneiros, arame farpado,
Escapas pra
não voltar aos dias de ontem,
Janelas
onde os olhares não cabem.
Enjoo dos
dias infinitos tenebrosos,
Com
distrações de mal-assombrados espantos.
A toda
hora esquentar de pavores reprimidos,
Reprimir
dos encantos, sufocar das esperanças.
Testar
toda noite a solidez dos blocos,
A rigidez
das pedras no desfio das mãos
E o fugir
pelos pátios iluminados de holofotes,
Ao zunir
das balas, atingidas ilusões.
Mastigar
corretamente os grãos escassos da vida,
Absorvendo
do garfo as imagens que escorrem,
Por força
da adrenalina ou da angustia sentida
(pois que
os bravos nunca morrerão...)
Ver
nessas horas que é tempo de voltar,
Antes que
as horas marcadas me denunciem
E a
vigilância tente me queimar
Por ter
chegado após a hora marcada
GRITO
DESARTICULADO
Ignez
Sparapanni
Se
atentarmos na mirada do satânico
encontraremos
lá,
ainda que
corrompido,
um anjo
no seu maior esplendor.
Assim
como em cada garganta
existe a
notícia do som,
da mesma
forma as ruínas
guardam a
raiva e esperam
o seu
dia.
Mesmo um
grito desarticulado
pode
ajudar a amanhecer o mundo
MORRE NÃO,
VELHA MÃE!
Ignez
Sparapanni
Os dias
hoje cravam sua imagem
De baitas
cicatrizes.
E em cada
verso cansura
O
universo de Adorama
Parece
mais um berro sangrento;
Sempre
escarafunchado pelos
Atalhos e
pinguelas
Do seu
cotidiano tão caipira
(já se
faz difícil beber a tragédia do seu morrê à míngua)
As
margens do pensamento perdem-se
Feito as
nuvens arcoirizadas,
Que o céu
despenca
Pra mode
embalar sua infantil velhice.
Aliás, é
por isso que
Adorama
ainda é uma fotografia
Quase
sépia de um tempo
Infinitamente
verão
PROSTI-TUTTI-QUANTI
Ignez
Sparapanni
Uma
Ave-Maria
I
Compreender
em cada olhar
a vaga
lembrança
de que um
dia em comum raiou para todos.
E ninguém
prestou atenção
Outra
Ave-Maria
II
Suportar
a vida sem artifícios ou lamúrias,
continuando
a sonhar, convalescente,
que este
mundo foi feito de vida.
mais uma
Ave-Maria
III
Sentir as
migalhas que o tempo deixou
e
mordê-las como quem não tem fome
e nada
mais a pensar:
Restará
ainda um pouco de pão para amanhã?
Pai-Nosso
IV
As Luzes
que se acendem e se apagam
são
movimentos de almas aflitas
roedoras
de esperanças
entre
frações de segundos.
Glória
V
Redenção
ao escovar os dentes
e cuspir
os pecados da noite anterior
Amém
VI
(Meu
coração para, mas se engana)
ESTRELAS
DA PENUMBRA
Ignez
Sparapanni
Quando o
dia lança o grito de adeus
e a noite
com seu manto negro se aproxima
elas
correm a se enfeitar
para mais
uma jornada.
Encostadas
nas esquinas da vida
são
estrelas da penumbra
a piscar
para garantir
o ganha-pão-cotidiano.
Cegas
para o futuro
morrem
com a noite
renovam-se
em cada manhã
quando
pálida esperança
desponta
no horizonte
para
apagar a tristeza
de não
terem o amor puro
que o
destino lhes negou.
CENA MUDA
Ignez
Sparapanni
Escrevo
poemas, invento cenários
Pintados
de tintas frescas, afago
Teus
pensamentos em signos fáticos,
Sonhando
com atos de amor.
É que, o
que penso, nunca falo,
E falo,
às vezes, o que não penso.
O que
sinto, de fato, tímido
Bate a porta
da garganta,
Avisando-te
da minha presença.
Abre-me a
porta da saudade
E invade
esse coração sem pena.
Partistes,
sem que nunca houvesse chegado...
Saudades
de um amor sonhado.
E com a
paciência de quem
Vai
tirando a forma do barro,
Nós vamos
compondo a nossa precária
E vasta
eternidade em cenários e atos
Dessa
vida que se faz teatro.
SOLUÇO
DERRADEIRO
Ignez
Sparapanni
Queria
descrever tudo
o que se
passa com a alma
quando solitária
perambula
por
caminho recolhido.
Queria
devolver tudo
o que se
ganha para a alma
quando
voluntária apregoa
um
conceito já vivido.
Queria
colher tudo
o que se
veste pela alma
quando
amargurada grita
por amigo
conhecido.
Queria
esquecer tudo
o que
fora, mesmo a alma
quando
nome ilustre
lembra
dela constrangido.
Queria
entender tudo
o que se
perde, sem a alma
quando
sobra espaço
para ela
construído.
BARES DA
VIDA
Ignez
Sparapanni
Garçom!
Por favor...
Dois
dedos de prosa
um trago
de cachaça
e um
pouco de atenção.
Traga-me
um pano
e limpe
essa dor
espalhada
no balcão.
Garçom!
Por favor...
Mais duas
cachaças,
uma pra
mim,
outra pra
minha alucinação.
Deixe-me
logo a garrafa,
baixe o
volume da saudade
ou ao
menos mude de estação.
Garçom!
Por favor...
Cigarro,
isqueiro e cinzeiro,
papel e
caneta tinteiro
e bom
bocado de inspiração.
Um
envelope sem remetente,
e peça
água de colônia ao barbeiro
para disfarçar
o cheiro desta assombração.
Garçom!
Por favor...
Uma
canção de Amor
e um
bocado de gelo
pra
anestesiar meu coração
E traga
logo a minha conta
e um
prego de pendurar alma
tão
maltratada pela paixão.
Garçom!
Por favor...
E se eu
não vier resgatá-la,
é porque
não preciso mais,
use-a
para limpar o chão!
De longe, eu a vi crescendo nas letras...hoje, de perto, confirmei suas letras de poeta, nome de poeta e a carinha de quem tem muito talento para os versos!
ResponderExcluirUm beijo, Ignez Sparapanni.
Damáris Lopes
Obrigada Damáris querida,mas confesso: Eu desconhecia os segredos,
ResponderExcluirque meu coração guardava...
beijos
Ignês, sua alma contou segredos que seu coração revelou e agora todos sabemos pela generosidade e sua mente..
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